Lusocom – federação assume o estatuto de confederação

Carlos Camponez

Lusocom e os Desafios do Pós-Desconfinamento

Quando, em 1997, no primeiro Encontro Luso-Brasileiro de Ciências da Comunicação, um grupo de investigadores pensou fundar a Lusocom — Federação Lusófona de Ciências da Comunicação, lançaram-se as bases para a criação de um espaço de pertença científica entre académicos falantes de português. Esse projeto teve subjacente a ideia de identidades, de histórias e culturas forjadas a partir de uma proximidade linguística. Esse é um legado indiscutível que ficou dos 27 anos que decorreram entre o encontro seminal da Universidade Lusófona, em Lisboa, e o “XV Congresso da Lusocom”, que se realizou nos dias 2 e 3 de setembro em Balneário Camboriú, no estado de Santa Catarina, no Brasil.

Posicionarmo-nos enquanto criadores de comunidade de sentidos implica interpelarmo-nos constantemente acerca das razões das nossas escolhas: porque estamos aqui; o que queremos ser; para onde queremos ir; o que nos faz estar juntos? Estas perguntas colocaram-se-nos, de uma forma particular, depois do “IV Congresso da Lusocom”, que decorreu na Universidade do Porto. Desde essa altura, quatro das cinco associações nacionais representantes das ciências da comunicação mudaram de direção ou fizeram-se representar por pessoas diferentes no seio da Lusocom. Para além disso, estávamos a sair de um período profundamente marcado pela pandemia da COVID-19 e pelas suas consequências determinadas pelo confinamento a que nos obrigou: confinamento físico, de que todos guardamos memória, certamente. Mas também confinamentos simbólicos, menos visíveis, mas nem por isso menos violentos, e cujos efeitos estão ainda demasiado frescos para que o nosso conhecimento — e o das ciências da comunicação, em particular — esteja em condições de as desvelar na sua plenitude. Seria, pois, natural que neste contexto sentíssemos a necessidade de revisitar as perguntas e os sentidos que nos colocámos anteriormente: porque estamos aqui; o que queremos ser; para onde queremos ir; o que nos faz estar juntos?

No caso da Lusocom, o confinamento implicou uma interrupção da publicação do Anuário — o último refere-se ao biénio 2020/2021 —, o adiamento do “XIV Congresso”, assim como a interrupção do procedimento bienal de rotatividade das direções. Este último facto fez com que deixasse de haver uma coincidência entre a presidência da Lusocom com o país acolhedor da reunião magna das associações federadas. Porém, a alteração mais profunda teve a ver com o facto de as circunstâncias terem mudado rotinas e, talvez mais importante de tudo isso, aquilo que nelas existe de identitário e de comunidade.

Durante este mandato, a Lusocom realizou uma série de ações e reflexões das quais gostaríamos de destacar três: (a) a revisão do protocolo de Maputo; (b) o alargamento da Lusocom a novos países; e (c) o repensar da edição do Anuário da Lusocom.

Revisão do Protocolo de Maputo

A equipa diretiva da Lusocom em funções entre 2022 e 2024 procedeu à revisão do Protocolo de Maputo. Com a assinatura do novo protocolo, o de Santa Catarina (Brasil), a federação passou a assumir o estatuto de confederação. A nova denominação foi considerada mais conforme com a ideia do modelo pretendido de integração dos membros que se associam à Lusocom, sem com isso abdicar da sua autonomia. Este conceito remete-nos para uma forma de participação e discussão que se pretende realizar internamente, sem outro vínculo que não seja o da participação empenhadamente livre de cada um dos seus membros. O conceito de “federação” foi, assim, considerado mais adequado às associações que integram a Lusocom, na sua tarefa de mobilizarem juntarem os centros de investigação das ciências da comunicação, a nível nacional.

A Lusocom abriu também o seu espaço de participação, criando a possibilidade de associações intervirem na qualidade de membros observadores, com voz, mas sem capacidade de voto. Esta possibilidade visa responder a processos de integração de novas associações e, sobretudo, dar resposta a realidades de países onde as ciências da comunicação ainda não estão implantadas e estruturadas de forma a dar origem quer a centros de investigação quer a estruturas federativas. Ao criar o estatuto de membro observador, a Lusocom assumiu o desafio de incentivar a criação e o desenvolvimento dos estudos em ciências da comunicação, promovendo redes e disponibilizando conhecimento. Do mesmo modo, esse alargamento fez-se a organizações que, assumindo necessariamente a sua vocação científica, representam também profissionais do setor da comunicação, integrando do ponto de vista associativo parcerias entre a academia, profissionais e empresas, como encontramos já, de forma multiforme e transversal, nos objetivos das associações com representação na Lusocom.

Alargamento da Lusocom a novos países

Na linha das preocupações identificadas, a Lusocom está também empenhada em alargar a representação dos países de língua lusófona. Nesse sentido, foram realizados contactos e missões em Angola com a Associação das Ciências da Comunicação de Angola e com a Universidade Agostinho Neto, com vista à criação de organizações representativas dos investigadores das ciências da comunicação. Em resultado dessas iniciativas, a Associação das Ciências da Comunicação de Angola submeteu já uma proposta de integração na Lusocom, que foi bem acolhida no “XV Congresso” de Balneário Camboriú, e um grupo de investigadores da Universidade Agostinho Neto tem em curso o projeto de fundação de uma associação especificamente voltada para os investigadores angolanos das ciências da comunicação.

Existem realidades de outros países que estão também a merecer a atenção da Lusocom: Guiné-Bissau, Timor-Leste, São Tomé e Príncipe e Macau. As associações nacionais que integram a Lusocom estão a estudar soluções para assumirem a responsabilidade de federarem os investigadores desses países, seja através da sua integração em redes regionais de investigadores, seja promovendo a criação de centros de investigação autónomos, conquanto esteja reunida a massa crítica suficiente para o efeito.

Repensar da edição do Anuário da Lusocom

A Lusocom está a procurar redinamizar o projeto do Anuário, que tem evidenciado alguma dificuldade em impor-se pela sua regularidade editorial. Nesse sentido, a atual edição surge já com um novo modelo. Em vez de se organizar a publicação a partir de uma chamada temática de propostas de artigos, mais consentânea com o formato tradicional de revista científica, a estratégia adotada consistiu em pedir a cada uma das associações que indicassem ou convidassem investigadores ou grupos de investigadores que escrevessem sobre investigações ou projetos recentes ou em curso, considerados de referência pelo seu impacto, pelos financiamentos ou prémios obtidos, pelo seu caráter inovador, pela sua internacionalização, entre outros elementos valorativos.

Este modelo pode funcionar em alternância com edições destinadas a dar expressão às investigações apresentadas nos congressos bienais da Lusocom, assegurando, deste modo, uma regularidade editorial nesta busca de criação de um sentido identitário em torno de temas científicos na área das ciências da comunicação. Entre outros projetos resultantes do cumprimento dos objetivos do novo Protocolo de Santa Catarina, os congressos e a edição do Anuário permanecem dois elementos agregadores que a Lusocom não está ainda em condições de secundarizar.

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